segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Pagamentos de serviços técnicos ao exterior e Ato Cosit nº 1 de 2000
















Em 5 de janeiro do ano 2000 o Ato Declaratório da COSIT nº 1 veio, para assombramento daqueles que lidavam com contratos internacionais, definir o seguinte:

I - As remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia sujeitam-se à tributação de acordo com o art. 685, inciso II, alínea "a", do Decreto nº 3.000, de 1999.

II - Nas Convenções para Eliminar a Dupla Tributação da Renda das quais o Brasil é signatário, esses rendimentos classificam-se no artigo Pagamento de serviços técnicos e Ato Declaratório COSIT nº 1 /2000 Rendimentos não Expressamente Mencionados, e, consequentemente, são tributados na forma do item I, o que se dará também na hipótese de a convenção não contemplar esse artigo.

III - Para fins do disposto no item I deste ato, consideram-se contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia aqueles não sujeitos à averbação ou registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI e Banco Central do Brasil.

Do alto da sua falta de entendimento quanto à necessidade dos Acordos para Evitar a Bitributação assinado com mais de 25 Países, a COSIT definiu que pagamentos feitos ao exterior para fins de pagamento de serviços técnicos passariam a ficar sujeitos ao Imposto de Renda retido na fonte, uma vez que tais pagamentos estariam incluídos no artigo 21 dos Acordos (que definia que pagamentos não expressamente mencionados  poderiam ser tributados também, no país de pagamento ) e não no artigo 7º dos Acordos que previam que o lucro das empresas só poderia ser tributado no país fonte dos serviços prestados.

A surpresa naquela época foi enorme até porque meses antes o próprio Ministério da Fazenda em resposta a consultas de contribuintes havia expresso e corretamente esclarecido que referidos pagamentos não estariam sujeitos ao Imposto de renda na fonte.

Ou seja, um Ato Declaratório expressava uma opinião totalmente oposta à própria posição do Ministério da Fazenda em processos de consulta aos contribuintes.

A este Ato nº 1 da COSIT seguiu-se em consequência diversos autos de infração contra empresas brasileiras que faziam aqueles pagamentos e não faziam a retenção do imposto e diversas ações judiciais, que ainda tramitam no Judiciário brasileiro, contestando aquela absurda interpretação dos Acordos dada pela COSIT.

Mas a época (ano 2000) era também de aumentar a arrecadação e por conta deste objetivo o então Secretário da Receita Federal Everardo Maciel não quis nem saber a passou a taxar os pagamentos de serviços técnicos feitos por empresas brasileiras para empresas no exterior independente do que dispunham os Acordos assinados.

Mas como diz o ditado, a Justiça tarda mas não falha e treze anos depois e ameaçados pela denúncia de mais um acordo (no caso o país que ameaçou a denúncia se o Brasil não alterasse a errônea interpretação do Acordo para evitar a bitributação foi Finlândia), a Procuradoria da Fazenda Nacional  finalmente alterou a absurda interpretação arrecadatória e definiu o que já estava definido nos acordos assinados pelo Brasil, ou seja, que pagamentos por serviços prestados ao exterior não está sujeito ao imposto de renda na fonte da mesma forma que a importação de equipamentos também não está, pois tais pagamentos se classificam dentro do conceito de lucro das empresas que está definido no artigo 7º dos Acordos assinados.

Desde então se gerou dentro da estrutura administrativa do governo diversos pareceres e interpretações que sempre tentavam suportar a posição do Ato COSIT nº 1, o que foi ao longo destes últimos 13 anos refutado pela maioria das decisões emitidas pelo Poder Judiciário.

Assim é que finalmente a Nota COSIT nº 13 de 2013, ao proceder a análise do tema, reconheceu a necessidade de revisão dos fundamentos do Ato Declaratório (Normativo) COSIT nº 1, de 2000, tendo em vista as decisões do Poder Judiciário Brasileiro, majoritariamente contrárias ao mencionado Ato, e logicamente também motivada por mais uma ameaça de denúncia de um Acordo assinado.

Em conclusão, a Coordenação do Sistema de Tributação - COSIT entendeu que:

a) “Conforme a regra geral dos acordos internacionais para evitar a dupla tributação, aplica-se às remessas decorrentes da prestação de serviços técnicos e de assistências técnicas o tratamento previsto no art. 7º (Lucros das Empresas);

b) na hipótese em que os acordos internacionais autorizem a tributação no Brasil, os pagamentos de rendimentos de prestação de serviços técnicos e de assistência técnica deverão ser submetidos ao tratamento previsto no Artigo 12 (Royalties), conforme estabelecido em dispositivo de protocolo;

c) sob outra hipótese em que as convenções internacionais autorizem a tributação no Brasil, nos casos de prestação de serviços técnicos de caráter profissional realizada por pessoa ou grupo de pessoas, os rendimentos de prestação de serviços técnicos deverão ser submetidos ao tratamento previsto no Artigo 14 (Profissionais Independentes), quando nele houver disposição expressa sobre atividades de caráter técnico.”

Argumentou, ainda, no sentido de que “a posição adotada pelo Ato Declaratório (Normativo) COSIT nº 1, de 2000, traduz interpretação equivocada das disposições dos acordos para evitar a dupla tributação e está em desacordo com o entendimento da doutrina internacional, o que gera violação dos tratados e motivos para sua denúncia.”

Saliente-se, entretanto, que esta não foi uma vitória fácil e por isso é interessante mencionar o voto do Ministro  Castro Meira relator do Recurso Especial (REsp) n. 1.161.467/RS que no seu brilhante voto menciona entre outras considerações aquilo que todos os que defendiam a aplicação das regras dos Acordos assinados pelo Brasil já mencionavam em suas defesas, ou seja, que o Fisco brasileiro quase sempre adotava uma interpretação literal e restritiva das normas convencionais, a redundar na não aplicação dos acordos.

O Ministro Meira se valeu de regra hermenêutica no sentido de que devem ser rechaçadas as interpretações que levem ao absurdo, tornando “absolutamente inaplicável uma norma” como seria a interpretação defendida nas posições fazendárias. Além disso, a tributação do rendimento somente no Estado de destino torna possível que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admitisse a retenção antecipada – e definitiva – do tributo na fonte pagadora, como defendia a União (Fazenda Nacional), inviabilizar-se-iam os eventuais ajustes da legislação estrangeira, afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no final do exercício financeiro.

Portanto, arremata o Ministro relator, “lucro da empresa estrangeira” deve ser interpretado em acepção mais ampla do que “lucro real”, sob pena de tornar sem valia o dispositivo do art. 7º dos Tratados e acolher a bitributação internacional como regra na Convenção, que objetiva, justamente, coibi-la.

Ou seja, em função disso foi finalmente sugerida pela Procuradoria da Fazenda Nacional a revogação do Parecer PGFN/CAT/nº776/2011 (que procurava defender a esdrúxula interpretação dos Acordos dada pelo Ato COSIT nº 1 de 5 de janeiro de 2000), opinando a Procuradoria que remessas ao exterior decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia melhor se enquadram no artigo 7º (Lucro das Empresas) que não estão pelos acordos sujeitos a tributação na fonte das remessas  e não nos artigos 21 ou 22 dos Acordos (Rendimentos não Expressamente Mencionados) que possibilita a retenção do imposto.

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