domingo, 14 de janeiro de 2018

Tributação dos investimentos feitos em empresas no exterior



A Receita Federal publicou recentemente a solução de consulta Cosit nº 678 que está dando o que falar.

Nesta Solução de Consulta (que é obrigatória para os agentes do governo, mas não para os demais contribuintes, já que se trata de uma interpretação de norma legal emitida pelo órgão Coordenação do Sistema de Tributação - daí a sigla Cosit), ou seja, os contribuintes que com ela não concordarem podem, sim, se vierem a ser notificados pela RFB discutir a interpretação da mesma perante o Poder Judiciário.

Entretanto, por mais que possa parecer neste caso, a Consulta Cosit tem razão quanto à tributação pois é a mesma que seria no Brasil se não houvesse por aqui a isenção (desde janeiro de 2005) do IRRF na distribuição dos dividendos.

Até o ano de 2004 a distribuição de dividendos no Brasil sofria uma alíquota de tributação de 15%, mas variou muito ao longo dos anos conforme se demonstra abaixo:

A Tributação - 1926 a 1975:  Os rendimentos de lucros e dividendos eram tributados na cédula F.

De 1976 a 1984: havendo retenção de imposto na fonte, o contribuinte podia optar entre oferecer os rendimentos de lucros e dividendos à tributação na declaração (cédula F) e compensar o imposto; ou incluir o total dos rendimentos como tributados exclusivamente na fonte; ou ainda incluir parte como “rendimento incentivado” e o remanescente oferecer na cédula F ou considerá-las como tributados exclusivamente na fonte. Se não houvesse desconto na fonte, a opção dependia do valor. Se fosse até um limite, variável anualmente, podia ser lançado como “rendimento incentivado”; se superior, o excedente era tributado na cédula F.

De 1985 a 1986: os lucros e dividendos podiam ser tributados exclusivamente na fonte ou na declaração. A opção pela tributação só na fonte para rendimentos de cédula F (lucros e dividendos) era feita em conjunto com os das cédulas A e B.

De 1987 a 1989: os lucros e dividendos eram tributados exclusivamente na fonte ou oferecidos à tributação na cédula F.

De 1990 a 1996: os lucros e dividendos estavam sujeitos à tabela progressiva da declaração ou eram tributados exclusivamente na fonte sendo que nestes anos as alíquotas variaram de 25% a 15%, sendo que a partir de janeiro de 1996 (artigo 10 da Lei nº 9.249/1995) os dividendos tiveram a tributação reduzida a zero até os dias de hoje.

Como os dividendos distribuídos no Brasil são atualmente isentos de imposto de renda (porque já são absurdamente tributados a nível de Pessoa Jurídica (que pagam IR mais CSSL 34%, PIS/COFINS 9,65 sobre o faturamento, mais IPI, ICMS. ISS etc. etc.), isto faz com que dividendos recebidos de investimentos feitos no exterior estejam sujeitos à tributação como rendimentos normais no Brasil (alíquota máxima de 27,5%), uma vez que a isenção para os dividendos só se aplica à empresa brasileira exatamente por conta da altíssima carga tributária.

Como os investimentos no exterior que foram regularizados pelo RERCT em 31 de outubro de 2016 ou 31 em 31 de julho de 2017 foram pela legislação considerados como custo de aquisição, qualquer valor repatriado ao Brasil acima dos valores regularizados estarão, sim, sujeitos à regra de tributação normal (alíquotas progressivas até 27,5%.).

Muitos contribuintes estão entendendo que o investimento feito em uma empresa no exterior que emite quotas ou ações, ao se liquidar o mesmo através de uma liquidação normal, sujeita-se à regra do ganho de capital e não de rendimentos normais. Não acredito que este entendimento encontra suporte nas formas de tributação que historicamente sempre existiu no Brasil para o dividendo.

Diferente seria se o investidor em uma empresa offshore como são chamadas estas empresas em jurisdições que cobram imposto muito abaixo dos nossos (por isso chamados de paraísos fiscais por alguns -a legislação brasileira chama de regimes de tributação favorecida aquele país que tributa na renda numa alíquota igual ou inferior a 20%), ao invés de liquidar sua empresa, vendesse as quotas ou ações da mesma para outra pessoa física ou jurídica tanto no Brasil quanto no exterior.

Nesta hipótese estaríamos falando de tributação de ganhos de capital que hoje varia de 15% a 22,5% dependendo do tamanho do ganho.

Por óbvio que se pode sempre questionar perante o Poder Judiciário esta tributação (no Judiciário Brasileiro se pode questionar qualquer coisa até sentença transitada em julgado), mas neste caso específico de discutir a tributação dos ativos liquidados em forma de ações ou quotas de empresa no exterior pela alíquota de ganhos de capital ao invés de tributação normal  com base no artigo 24 da Medida Provisória nº 2.158-35de 2001 (que não se sabe onde se encontra já que não foi transforma até hoje em Lei), ou com base na Solução de Consulta Cosit nº 131 de 2016,  é uma discussão com argumentos não muito convincentes ao meu modesto ver.

Melhor seria se utilizar das decisões emitidas pela Sexta Câmara do Conselho de Contribuintes (“CC”), predecessor do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), em 2005, no Acórdão nº 106-15.131. Na ocasião, o CC afirmou que a devolução de capital não seria tributável para o sócio pessoa física, ainda que recebida em dinheiro, tendo em vista justamente a aplicação do Artigo 22, § 4º, da Lei nº 9.249/1995. Além disso, a Segunda Turma Especial da Segunda Seção do próprio CARF (Acórdão nº 2802¬-002.575) chegou à mesma conclusão em 2013, também sobre uma devolução de capital em dinheiro.

Embora decisões que não se repetem não ganham o status de jurisprudência consolidada pelo menos mostra que alguns pensam diferente. Talvez seja o caso de se utilizar de todos os argumentos disponíveis que possam ser tidos como favoráveis aos contribuintes.

A grande realidade é que nossa legislação é uma colcha de retalhos, onde até mesmo os julgadores que são pessoas providas de preparo técnico estão sujeitos a mudarem suas opiniões ou julgamentos conforme esteja a fome do Leão. Quando a fome é grande (como atualmente tenta-se tributar tudo até INSS sobre rendimentos do carnê leão).

De qualquer forma, em sendo relevante o valor do imposto vale, sim, a pena uma discussão perante o Judiciário pois nossa jurisdição fiscal (ao contrário dos paraísos) é mesmo um inferno para os contribuintes e se há uma mínima possibilidade de ganho deve-se procurar o seu direito cabendo a nós profissionais alertar bem sobre as probabilidades para não induzir o cliente a litigar.

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